Escalar uma montanha de pedras
Escalavrar pés e mãos
Encontrar aqui e ali musgos, lagartos, cacos (de vidro de pessoas de coisas?)

Perder o ar
Escorregar

Retomar o já feito
Pisar em pontas finas
em pontos falsos
em pontes móveis

Encontrar aqui e ali uma sombra, um refúgio, a trégua do gozo
Pular de uma parte a outra de um buraco negro
Não olhar para baixo

Olhar para baixo
E desfalecer
desanimar
destemperar

Parar
Res pirar
Subir Subir Subir
Escalavrar pés e mãos
Despistar medos
Descobrir forças
Esquecer os olhos da plateia

Chegar
Descansar
Contemplar
Sorrir
Suspirar

E empreender a volta definitiva

 

 

O problema é que a noite é muito longa

 

Fosse mais curta

As recordações não acabariam em culpa e remorso

E não haveria rugas cada vez mais fundas

 

Fosse mais curta

O medo se perderia dos sonhos

E não haveria tão menos neurônios

 

Fosse mais curta

A confabulação dos mortos em meus ouvidos

Aos poucos

Docemente

Se acalmaria

Amém

 

Política é isto.
O sujeito, já aposentado, mas ainda relativamente jovem, apesar do que aparentava a careca e a barriga, arranjou uns bicos como representante comercial e passou a visitar prefeituras de cidadezinhas do interior mineiro.
Daí que, chegando a uma delas, pequenina e praticamente desconhecida, acabou por fazer, além de negócios, amizade com o prefeito, que o convidou a voltar outras vezes para “tomar uma cachacinha”.
Ele voltou muitas outras vezes até que, vislumbrando arranjos para o futuro, convenceu a patroa a se mudarem para lá em definitivo.
Assim fez. Instalado em uma bela casa, pagando um aluguel barato, o figurinha foi se enturmando com as personalidades locais, sempre com o aval do prefeito. Passou a frequentar certos bares (ou melhor, os bares certos), a participar de festas no clube da cidade e dos eventos culturais, a assistir às missas aos domingos, sempre na cola do prefeito.
Até que chegaram as eleições municipais. O prefeito candidatou-se à reeleição e seu novo amigo, a vereador. Cumpriu a via crucis de praxe: visitou as casas, tomou os cafés, carregou as criancinhas. Sempre na cola do prefeito.
A cidadezinha, no entanto, revelou-se um tanto quanto rebelde, pois reelegeu o pirata, mas deu apenas 25 votos para o seu papagaio.
Vinte-e-cinco, como passou a ser chamado pela oposição, não se abalou e está se preparando para as próximas eleições municipais. Neste ano, já ajudou a montar a aparelhagem de som para as festas de carnaval, ocasião em que também desfilou em vários blocos; além disso, dançou a quadrilha com os participantes do Movimento da 3ª Idade e faz parte ativamente do Conselho Tutelar da cidade.
Na semana santa, lá estava ele, durante as encenações da paixão de Cristo, vestido de soldado romano, com saiote vermelho e lança na mão.
Política é isso.
Aprendeu?